nos estudos de teatro / artes cénicas

por Ana Pais

Os Estudos de Teatro estabelecem-se em Portugal no final do século XX, mais concretamente, em 1991, com o Curso de Especialização em Estudos de Teatro, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Não temos, portanto, aquilo a que podemos chamar uma tradição académica neste campo em relação à qual o novo paradigma dos Estudos de Performance se possa insinuar como um modelo alternativo de ferramentas e metodologias para pensar o fenómeno das artes ao vivo. Ao contrário da maioria dos países europeus e norte-americanos, em que os departamentos de Estudos de Teatro datam do início do século XX, Portugal inicia a sua implementação vinte anos depois de os Estudos de Performance surgirem nos Estados Unidos.

Centros de Investigação e Departamentos académicos

O Centro de Estudos de Teatro (CET) é o primeiro organismo dedicado ao estudo da actividade teatral criado numa Universidade portuguesa. Nasce pela mão de Osório Mateus, figura emblemática da tradução, edição e investigação de teatro, práticas que aliava à encenação. Professor no Conservatório Nacional no período pós-revolucionário, será na Universidade de Lisboa que o seu trabalho cria raízes. Ali instituiu o ensino da cadeira de História do Teatro (1980), o Curso de Especialização em Estudos de Teatro, para além da fundação do CET (1994). Iniciado por um sólido núcleo de base – Maria Helena Serôdio, Maria João Brilhante, José Camões –, aos quais se associaram alunos saídos do curso de especialização, o CET tem produzido ferramentas indispensáveis para o estudo do teatro em Portugal[1] e desenvolvido um conjunto de programas de investigação fundamentais[2]. Este centro de estudos, oriundo da tradição filológica e da crítica teatral, lançou as bases para uma história do teatro português ou feito no país, abraçando a tarefa hercúlea de reunir dados existentes para os disponibilizar ao público, tornando-se na primeira instituição a formar investigadores no campo específico da investigação teatral. Actualmente, o CET oferece um programa de mestrado e de doutoramento em Estudos de Teatro.

Também em 1994, o Instituto de Estudos Teatrais da Universidade de Coimbra, primeiramente dirigido por José Oliveira Barata e, actualmente, por Fernando Matos Oliveira, dinamiza a investigação académica no campo do teatro, sendo bem conhecida a relação próxima desta universidade com o mesmo. Desde 1959, oferece cadeiras de história do teatro, possui uma das maiores bibliotecas do país (Sala Dr. Jorge de Faria) e exibe uma longa tradição de teatro universitário – o TEUC, fundado por Paulo Quintela (1938) e o CITAC (1954/1956). Em 2002, nasce a licenciatura de Estudos Artísticos, dirigida por Fernando Matos Oliveira, na qual o teatro é leccionado a par de outras artes (Ciências Musicais, Estudos Cinematográficos, Fotografia e Novos Media), optimizando as valências teóricas e artísticas dos formandos.

No seu encalço, surge o Departamento de Artes Cénicas na Universidade de Évora (1996), criado por Christine Zurbach e Luís Varela, oferecendo uma licenciatura em Teatro. Desde a sua primeira reestruturação (pré-bolonha), as áreas Ensino e Formação Vocacional autonomizaram-se, num processo que contou com a colaboração técnica e artística do CENDREV – Centro Dramático de Évora. Desde 2009, o Departamento de Artes Cénicas, oferece ainda um mestrado, a par da criação do Centro de Investigação e Criação Artística (CHAIA).

Mais recentemente, em Lisboa, é criado o Mestrado em Artes Cénicas (MAC), no Departamento de Ciências da Comunicação da Universidade Nova de Lisboa, coordenado por Paulo Filipe Monteiro e quereúne vários departamentos da FSCH (Ciências Musicais e de Línguas, Culturas e Literaturas Modernas). Aposta na interdisciplinaridade e afirma-se como promotor de uma reflexão sobre o “acto performativo”, não sobre o texto dramático. Ao organizar o número 24 da Revista de Comunicação e Linguagens, em 1998, Paulo Filipe Monteiro convida André Lepecki a traduzir para português o capítulo “Ontologia da Performance” da obra fundamental para os Estudos de Performance Unmarked. The Politics of Performance (1992), de Peggy Phelan. Publica também o artigo da eminente académica alemã Erika Fisher-Lichte “Performance e cultura performativa: o teatro como modelo cultural”. No ICS – Instituto de Ciências Sociais, destaca-se a investigação de carácter sociológico de Vera Borges, sobre as profissões, mercados de trabalho artísticos e as vidas de actores e encenadores portugueses – e de Cláudia Madeira, sobre o conceito de “híbrido” e de “arte social” nas artes performativas contemporâneas.

Em 2010, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, institui-se o MET – Mestrado em Estudos de Teatro, dirigido por Alexandra Moreira da Silva e Gonçalo Villas-Boas. Inserido no Departamento de Estudos Germanísticos, este programa de estudos oferece um currículo ligado à tradição literária e filológica. Em 2012, a Universidade de Lisboa associa-se ao Instituto Politécnico de Lisboa (em colaboração com várias escolas Faculdade de Belas Artes, Faculdade de Letras, Instituto de Ciências Sociais, Instituto de Educação, Escola Superior de Dança, Escola Superior de Música de Lisboa e Escola Superior de Teatro e Cinema) para criar um doutoramento em Artes Performativas e Imagem em Movimento que se dirige, particularmente, aos mestres nas áreas dos Estudos Artísticos, Humanidades e Ciências Sociais.

Revistas e publicações

Em termos de publicações da especialidade, a revista com mais história é a Adágio, publicada pelo CENDREV desde 1990. Igualmente promovidas por companhias de teatro, a revista Cadernos de Teatro de Almada, dirigida por Joaquim Benite, vem a lume em 1997 e, dois anos mais tarde, surge a revista dos Artistas Unidos. Em conjunto com a APCT (Associação Portuguesa de Críticos de Teatro), o CET edita, desde 2004,  a revista Sinais de Cena que anualmente faz uma compilação exaustiva das publicações no campo. Entre 2007 e 2010, a revista Obscena, dirigida por Tiago Bartolomeu Costa, promoveu um necessário espaço internacional de divulgação e discussão não apenas de teatro, mas também de dança e arte da performance. Com uma periodicidade irregular, têm surgido igualmente revistas em suporte electrónico, promovidas por instituições de ensino e/ou centros de investigação, por exemplo, a Par – Pensar a Representação (publicação anual do trabalho teórico dos docentes da ESAD), a Drama – revista de cinema e teatro (publicada pela Associação Portuguesa de Argumentistas e Dramaturgos) e ainda a Verónica (revista do CITECI – ESTC). Finalmente, destaca-se a revista Sete Palcos, editada pela Cena Lusófona, que tem sido uma montra do que se faz na cooperação teatral entre todos os países da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), e em cujo primeiro número foram publicados excertos de vários textos seminais de Richard Schechner e Victor Turner (traduzidos por Maria José Fazenda e José António Fernandes Dias).

O Ensino do teatro em Portugal

No que respeita ao ensino vocacionado para a prática artística, é criada, no Porto, a ESMAE (Escola Superior de Música e Artes do Espectáculo) ainda na década de noventa. Na mesma cidade, a ESAP – Escola Superior Artística do Porto, inicia uma licenciatura emTeatro, em 2009. A partir deste ano surge ainda, da iniciativa privada, a ESTAL – Escola Superior de Tecnologias e Artes de Lisboa, que oferece uma licenciatura emArtes Performativas.

Nesta área, porém, a instituição de maior tradição e prestígio é a ESTC (Escola Superior de Teatro e Cinema), em Lisboa. Antigo Conservatório Nacional, inaugurado por Almeida Garrett em 1836, a ESTC oferece uma licenciatura de Teatro com vários ramos de especialização e, até ao ano de 2009, uma licenciatura em Dramaturgia. Desde 2006, a ESTC oferece igualmente mestrados em diversas áreas do espectáculo e desenvolve uma investigação interdisciplinar no Centro de Investigação em Teatro e Cinema (CITECI). É de notar o surgimento de uma licenciatura de Teatro no território das artes visuais (ESAD – Escola Superior de Artes e Design, nas Caldas da Rainha), em 2002, que se se seguiu o mestrado, ao qual está associado um Centro de Investigação de Artes Performativas. Criado de raiz pelo encenador João Garcia Miguel, estes novos graus abriram um espaço académico mais próximo da arte da performance.

Os Estudos de Teatro em Portugal têm 17 anos, o ensino da arte teatral quase duzentos. A maioria das licenciaturas que se podem obter no país são oferecidas, quer por departamentos associados aos Estudos Literários, à semelhança do que acontecia também internacionalmente, e, depois das adequações curriculares ao espaço europeu de ensino superior (Declaração de Bologna, 1999), quer por Escolas Superiores ligadas ao ensino técnico, onde o peso da teoria e do pensamento crítico é significativamente inferior ao das instituições universitárias.

BIBLIOGRAFIA

PHELAN, Peggy, 1997, “A Ontologia da Performance. Representação sem produção, Revista de Comunicação e Linguagens, trad. André Lepecki, nº 24, pp.171-191.

FAZENDA e FERNANDES DIAS, Maria José e José António, 1996, “Antropologia. Performance. Teatro”, Sete Palcos, nº 1, Dezembro, pp. 58-65.

LINKS

http://www.fl.ul.pt/cet

http://www.uc.pt/fluc/artisticos

http://pt.wikipedia.org/wiki/Teatro_dos_Estudantes_da_Universidade_de_Coimbra

http://citacteatro.blogspot.pt

http://doutoramentoemartes.ul.pt

http://www.cendrev.com

http://www.uevora.pt/conhecer/unidades_organicas/escolas/escola_de_artes/departamento_de_artes_cenicas

http://www.unl.pt/guia/2012/fcsh/c-4294

http://www.cecl.com.pt/rcl

http://www.ctalmada.pt/cgi-bin/wnp_db_dynamic_browse.pl?dn=db_imprensa&sn=pub_cadernos

http://www.apcteatro.org/output/index.asp?o=7

http://cadernospar.blogspot.pt

http://drama.argumentistas.org

http://triplov.com/teatro

http://www.cenalusofona.pt/paginas/06edicoes.html

http://www.esmae-ipp.pt

http://www.esap.pt

http://www.estal.pt

http://www.estc.ipl.pt

http://www.esad.ipleiria.pt


[1] CETbase – base de dados sobre teatro em Portugal, OPSIS – base de dados iconográfica.

[2] HTP online – documentos para a História do teatro em Portugal, e TESOURO, edição crítica de textos de teatro dos séculos XVI e XIX.