Conceitos e Dispositivos de Criação em Artes Performativas
26-28 de Novembro de 2015
Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra
CONFERÊNCIAS
Madalena Perdigão e a Curadoria da Falta
Ana Bigotte Vieira
IFILNOVA – Instituto de Filosofia da Nova e IHC – Instituto de História Contemporânea, Universidade Nova de Lisboa; Centro de Estudos de Teatro, Universidade de Lisboa e baldio | estudos de performance
26/11/2015, Quinta-feira,15:40-17:20
Quando em 1984 é inaugurado o Serviço de Animação, Criação Artística e Educação pela Arte/ACARTE da Fundação Calouste Gulbenkian tem inicio uma nova fase da vida do complexo Gulbenkian, à Av. de Berna, em Lisboa, e com ela um novo momento da vida cultural lisboeta e nacional. Em causa está a entrada em funcionamento do primeiro museu de arte moderna em Portugal – um museu que se define como sendo um centro de cultura e não um museu. Incorporando na sua construção os debates dos Anos Sessenta, o edifício do CAM é composto por dois corpos distintos: o Museu de Arte Moderna, formado por três galerias; e um espaço de animação cultural atribuído ao ACARTE, dispondo de uma Sala Polivalente, de uma sala de exposições temporárias e de ateliers para actividades artísticas, estendendo-se aos átrios e à cafetaria, bem como ao anfiteatro ao ar livre e contemplando um pavilhão para crianças. Em causa está igualmente a redefinição, já em democracia, do papel da Fundação Calouste Gulbenkian no âmbito da cultura.
Incidindo a sua acção sobre a presença ao vivo do corpo em acção no espaço do museu, o ACARTE insistirá no papel do museu enquanto fórum de cultura. Assim – e uma vez que, no entender da sua directora, Madalena Perdigão, “fazia falta no panorama cultural português um Serviço voltado para a cultura contemporânea e/ou para o tratamento moderno de temas intemporais, assim como um Centro de Educação pela Arte dedicado às crianças” – este serviço reunirá na sua programação actividades muito diversas, do teatro, à dança, ao cinema de animação, à música, à literatura, à performance arte, ao vídeoclip… constituindo-se enquanto ponto de encontro singular entre pessoas, géneros artísticos, práticas culturais e formas até então pouco conhecidas de viver a cidade e o urbano.
Num país saído de uma ditadura de quase meio século, a uma década da Revolução e a pouco tempo da adesão de Portugal à CEE, trata-se da construção por tanto tempo adiada de um país ‘moderno’ – termo no qual convergem e chocam entre si significados distintos.
Apresentando, por um lado, a Timeline ACARTE 1984-1989, um interface digital por mim construído de forma a possibilitar a abertura da acção deste Serviço a estudos futuros, e por outro, a noção de ‘Curadoria da Falta’ para caracterizar a acção de Madalena Perdigão enquanto Directora do ACARTE, gostaria de equacionar o papel institucional deste Serviço da Fundação Calouste Gulbenkian enquanto dispositivo fundamental nas artes performativas portuguesas contemporâneas, mas não apenas, propondo eventualmente um olhar sobre as Instituições a partir de um ponto de vista não do público nem do privado, mas do comum.
Palavras-Chave: Gulbenkian, ACARTE, Madalena Perdigão, Anos 80, Europa, Museu de Arte, Performance no Museu.
Sobre o quebrar da pele: incorporações da linguagem em dança e filosofia
Ana Mira
IFILNOVA – Instituto de Filosofia da Nova, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa e baldio | estudos de performance
27/11/2015, Sexta-feira, 14:30-15:50.
“Mas, se voltarmos por pouco que seja, às fontes respiratórias, plástica, ativas da linguagem, se relacionarmos as palavras aos movimentos físicos que lhes deram origem, se o aspecto lógico e discursivo da palavra desaparecer sob seu aspecto físico e afectivo, isto é, se as palavras – em vez de serem consideradas apenas pelo que dizem gramaticalmente falando forem ouvidas sob seu ângulo sonoro, forem percebidas como movimentos, (…) a linguagem da literatura se recomporá, se tornará viva”
Antonin Artaud (carta a Jean Paulhau, 28/05/1933) In: Uno (2012)
O estudo Sobre o quebrar da pele: incorporações da linguagem em dança e filosofia, parte da reactivação de um documento escrito e audiovisual de um corpo que dança, em estúdio, no contexto de um laboratório de investigação e criação coreográfica.
Analisam-se, em seguida, algumas abordagens filosóficas sobre a presença do corpo na linguagem verbal e no pensamento conceptual, nomeadamente como a dança restitui corpo à linguagem e, por sua vez, esta atravessa e transita a dança, em Valéry (Fabbri 2009). O tempo branco lacunar do papel, sobre o qual a mão treme, a voz hesita e a escrita é ameaçada, em Genet (Uno 2012). A tradução de um silêncio na escrita, em Bousquet (Maia 2010). As “palavras-força” ou “palavras-acção”, que são também as “palavras sopro de Artaud”, em Gil (s/d).
Na tríade corpo que dança em estúdio/documento sensível (escrita e audiovisual)/pensamento conceptual, pretende-se ensaiar um dispositivo em dança e filosofia que visa, numa relação de ressonância entre estas duas instâncias, a reinvenção do corpo e a construção de uma possível abordagem aos estudos críticos da dança, realizada pela perspectiva do corpo que dança e sobre a sua própria condição de dançar.
Palavras-Chave: Corpo, dança, documento, linguagem e pensamento.
Instantes para Broken Fall (organic), vídeo de Bas Jan Ader
Ana Riscado
Produtora cultural e actualmente frequenta o mestrado em Antropologia das Culturas Visuais, na FCSH-UNL.
27/11/2015, Sexta-feira, 11:20 – 13:00
O presente ensaio visa contribuir para uma releitura da obra do artista holandês Bas Jan Ader, a partir dos estudos em stillness/motion presentes na literatura sobre fotografia e cinema. De que forma a paralisação em imagens dos vídeos produzidos nos anos 70 por aquele artista nos ajudam a compreender o fundamento da sua obra? Que relações se podem estabelecer entre o tempo real, o tempo da fotografia e o tempo do filme? Qual a “verdade” contida numa representação da realidade por um dispositivo técnico como uma câmara? Como medir a equidistância entre o momento do snapshot realizado pelo fótografo e a interpretação feita pelo espectador do objecto/sujeito representado? Como pode ser pensada ontológicamente a técnica de produção de imagens fixas e a sua colocação em movimento?
Palavras-chave: Punctum, “Entre imagens”, Desaparecimento.
O temperamento do jogo dramático e a profanação dos dispositivos disciplinadores do senso comum
Ricardo Seiça Salgado
CRIA – Centro em Rede de Investigação em Antropologia e baldio | estudos de performance
27/11/2015, Sexta-feira, 17:20-18:40
O nonsense, o sem sentido, o jocoso, caracteriza o temperamento do jogo dramático. Em condições de experimentação artística ele activa a possibilidade de desvinculação dos dispositivos tradicionais do processo teatral que governam a criatividade, participando na reinvenção das vanguardas por via do procedimento. No momento em que o jogo se dramatiza, vai devolver ao comum a liberdade pelas práticas de criação, interferindo potencialmente (e seguindo Agamben) na profanação dos corpos dóceis das sociedades disciplinadoras. O jogo dramático, enquanto mínimo denominador comum da possibilidade de teatro, em certas condições de experimentação, torna-se um contra-dispositivo.
Palavras-Chave: jogo dramático, contra-dispositivo, resistência, experimentação, teatro.
OFICINA
O que é um dispositivo? Um diálogo
Org. conjunta de Ana Bigotte Vieira, Ana Mira, Ana Riscado e Ricardo Seiça Salgado.
28/11/2015, Sábado, 11:00-13:00.
«Generalizando posteriormente a já amplíssima classe dos dispositivos foucaultianos, chamarei literalmente de dispositivo qualquer coisa que tenha de algum modo a capacidade de capturar, orientar, determinar, interceptar, modelar, controlar e assegurar os gestos, as condutas, as opiniões e os discursos dos seres viventes.»
Giorgio Agamben, ‘O que é um dispositivo?’ (2005).
«Assim, todo o dispositivo se define pelo que detém em novidade e criatividade, e que ao mesmo tempo marca a sua capacidade de se transformar, ou de desde logo se fender em proveito de um dispositivo futuro, a menos que se dê um enfraquecimento da força nas linhas mais duras, mais rígidas, ou sólidas.»
Gilles Deleuze, ‘O que é um dispositivo?’ (1996).
SINOPSE
Se nos anos Oitenta do século XX, em O que é um Dispositivo? Gilles Deleuze desenvolve e comenta a noção de dispositivo avançada por Michel Foucault, duas décadas mais tarde, Giorgio Agamben retomará a interrogação acrescentando-lhe novas direcções. Nos dois textos, dialógicos ambos, parece estar em causa não só a proposta foucauldiana como a urgência, os ecos e as contaminações que esta encontra nos seus interlocutores, interpelando-os uma e outra vez a colocar a questão, em circunstâncias concretas, a partir das suas próprias propostas filosóficas.
No workshop O que é um dispositivo? em diálogo, baldio | estudos de performance sugere um re-colocar em diálogo os dois textos equacionando com isso a performatividade do termo bem como a sua disseminação na academia e nas artes.
Bibliografia:
DELEUZE, Gilles, 1996 (1989), “O que é um dispositivo?”. Em O mistério de Ariana. Lisboa: Vega.
AGAMBEN, Giorgio, 2005, “O que é um dispositivo”. Outra travessia: revista de literatura. Ilha de Santa Catarina, n. 5, p. 9-16.
INSCRIÇÕES
Existe um número limitado de vagas para participação no workshop. Aos interessados pedimos o favor de solicitarem inscrição prévia através do endereço de email do Colóquio: conceitos.dispositivos@gmail.com